domingo, 17 de junho de 2012

[À Lareira Com] - Fátima Marinho

Bom Dia e Bom Domingo.
Hoje, uma conversa fresquinha com a Fátima Marinho, que acham?


 À Lareira com...Fátima Marinho

Fale-nos um pouco sobre si.
 
De mim sei pouca coisa, acredite. Como o grande poeta Craveirinha, tenho a perceção de ter nascido vezes sem conta. Como ele, de cada vez que nasci de novo, “deixei um problema e encontrei um enigma”.
Sou um andarilho que procura a paz. Dentro dela corre a liberdade. É pela liberdade que me movo. A liberdade de ser, sentir e saber sem liames e ataduras.
Nascida no Alentejo, tenho lares espalhados pelo mundo. Essa segurança não me livra de me sentir, por vezes, uma apátrida. Sabe, uma parte de mim é profundamente inextrincável e solitária, apesar da minha extraordinária família, das profundas amizades que conservo, tenho um grande fascínio por casas e praças vazias, não sei porquê! Bom, talvez seja a minha ânsia de ver praças cheias de pessoas felizes, ao contrário de as sentir pejadas de injúrias. É isso. Sou uma mulher disposta a lutar para que a terra que piso seja benfazeja para os que me vão suceder, e, a arte de lutar pela paz aprende-se, creio eu, no silêncio que busco.

 
Tem vários livros publicados. Como surgiu a oportunidade de ingressar neste mundo da escrita e dos livros?

Em 2006, fui convida para participar, como co-autora, na elaboração de manuais escolares da livraria Arnado, do Grupo Porto Editora. Foi essa a minha primeira e extraordinária experiência com o mundo editorial.
Em 2010, a editora Alphabetum apresentou-me o seu projeto editorial e convidou-me para editar livros que estavam na gaveta. Como vê, foi simples.

 
Dos livros que tem publicados, algum deles tem um significado mais especial? Se sim, porquê?

Todos os livros estão carregados de significações. Logo, cada um é, ao seu jeito, muito particular.

A sua vida pessoal e profissional influenciam, de algum modo, os seus livros?

Muito. São ostensivamente inspiradoras. Lamento, apenas, o pouco tempo que essas duas vidas – a pessoal e a profissional – permitem ao exercício da escrita.

 
Estudou num colégio de freiras. Como é que essa experiência na sua vida influenciou a pessoa que é hoje?

Bom, para ser mais precisa, estudei num Colégio Católico e vivi num Colégio/Lar de freiras. Foram períodos interessantes e felizes, desses que nos estruturam para as agruras inusitadas da vida. Talvez essa experiência tenha vincado a minha vocação para procurar a alegria e romper com os estereótipos. Sim, a minha formação profundamente católica não me prendeu ao culto de divindades externas à face humana. Como a poetisa Natália Correia, “creio em deuses e anjos que andam pelo mundo”. Creio no profeta Jesus Cristo, mais por ter vivido como um homem do que por ser, alegamente, filho de Deus. Viver é a maior prova de que somos divinos. Viver num corpo de carne e osso, com vísceras  e todos os constrangimentos adjacentes, é tarefa de Deuses.
Quando estamos dentro das instituições, dessas aparentemente poderosas que proliferam por aí, percebemos o quão frágeis são os seus fundamentos, e, quão robustas e eternas podem ser as leis que presidem à  busca da humildade, da liberdade e do amor. São esses os grandes desafios. As hierarquias, com destaque para as que nos apontam o céu, não creio nelas. A essas graduações das relações entre seres humanos e o que divino nos habita, devemos a descrença e a manipulação que guia o medo. Eu defendo, como já disse, a liberdade do pensamento e o desassombro, essa plenitude de estar que nenhum grilhão pode prender. 


O nascimento do seu sobrinho, portador de trissomia 21, impulsionou-a a escrever o livro “Á procura de um lugar”. Ter uma criança com Trissomia 21 na família, mudou, de algum modo, a sua maneira de ver a vida?

 
Todos os acontecimentos inesquecíveis nos mudam. Dessa forma, o nascimento do meu sobrinho mudou-me, sim. Com ele aprendi, que, como já disse, o amor é o nosso maior bem e lutar por ele, a nossa maior força.
 

Julga que as pessoas ainda estão, de algum modo, mal informadas sobre a Trissomia?

De todos os modos. Não só sobre a trissomia, como sobre todas as aparentes limitações que as deficiências trazem consigo. Está quase tudo por fazer, quando falamos de respeito pela diferença. Ler “À Procura de um Lugar” é um pequeno passo, para a entendimento dos passos que urge dar. A falta de informação alimenta as cadeias do ostracismo a que as pessoas especiais, queiramos ou não admitir, ainda são votadas.
 
 
Tem projectos para um futuro próximo, no que concerne a livros? Se sim, pode desvendar-nos um pouco?

Sim, depois do “À Procura de um Lugar”, do “Mistério das Coisa Erradas” e do livro de Poesia “Ama-me sem me Suportares”, gostaria muito de ter tempo para rever e terminar o romance “A Sombra do Lacrau” e publicar a minha tese de mestrado, defendida em 2007, e que, ao perguntar “Quem Sou Quando Não Sei?”, incide sobre as implicações das dificuldades de aprendizagem na definição da identidade.

 
O que lhe dá mais gosto na escrita?
 
Descobrir que sei pouco sobre mim e sobre os outros. A escrita descobre-me e desoculta sentimentos alheios, o que é avassalador.
 
O que pode dizer aos nossos leitores, sobre a escrita, a vida ou algo que considere relevante transmitir?

Aos nossos leitores desejo que vivam intensamente o mal e o bem, a desgraça e a fortuna, mas, se puderem, optem, ainda que seja a opção final, pela leveza. Essa decisão vale uma vida. Quem a tomar, sente-se e escreva, que a inspiração favorece os audazes.

Sem comentários:

Enviar um comentário